domingo, 18 de novembro de 2007

Na faixa

Conceição Freitas mandou ver na coluna Crônicas da Cidade no Correio nesse domingo. Ela apontou “Dez Mentiras” sobre Brasília que todo mundo (de lá/de fora) gosta de dizer. Começou com a famosa frase: “Em Brasília só tem corrupto!”, seguiu separando o joio do trigo, explicando a diferença entre Oscar Niemeyer e Lúcio Costa e concluiu mostrando que faz tempo que Brasília deixou de ser setorizada.
Gostei D+.
Quem é assinante pode conferir no site do Correio:
http://www2.correioweb.com.br/cbonline/indice.htm
No fim do dia estava eu ligada na HBO - primeiro episódio da segunda temporada de Mandrake. Adivinhem onde o personagem do Marcos Palmeira veio resgatar uma puta que ia ser sacrificada em um ritual muito estranho? É...na nossa BSB. As frases de desqualificação da cidade jorravam da boca de todos os personagens... debochar de políticos não é novidade, mas até a galera comedora de folhas de Alto Paraíso foi sacaneada... Acreditam que os caras não se deram ao trabalho de vir filmar em Brasília? Colocaram umas imagens suuuper velhas no ar. O trânsito em frente ao Congresso era no sentido contrário ao que é hoje em dia. O Mandrake foi encaixado em um táxi, dando uma voltinha pela Esplanada, depois apareceu tomando um chope em um copo de plástico num trailer em frente ao Museu Nacional, a Catedral aparecia ao fundo. Esculhambou geral...
Aí, só de raiva, resolvi escrever sobre uma das coisas que eu mais gosto em Brasília – parar na faixa para que os pedestres atravessem.
É gente, eu adoro as faixas. Na grande maioria das vezes sou motorista e não pedestre. Mesmo assim, mesmo quando estou atrasada, adoro ver os pedestres e suas mil e uma maneiras de fazer o “sinal de vida” e atravessar uma rua.
Não vou dizer que é porque para mim é uma experiência antropológica, para mim, é diversão mesmo.
O meu tipo de pedestre favorito é o que eu chamo de adventista do sétimo dia. Ele chega na faixa e aponta o dedo pro céu, como se quisesse lembrar ao mundo: “Jesus, está voltando! O fim está próximo!”. Ele anda apressado pela faixa (parece que está atrasado para o culto) e nem olha para os motoristas (desprezo total, é como se soubesse que você, faça o que fizer, vai mesmo pro inferno!).
Também gosto muito do pedestre soldado - aquele para o qual todo dia é 7 de setembro. Com o braço duro, esticado mesmo, ele sinaliza que vai atravessar e vai mesmo, cabeça erguida, ele não olha pro lado, ele marcha na faixa... “Um, dois - feijão com arroz - três, quatro – feijão no prato!”.Gente, e o pedestre deprimido? Ele não dá sinal de vida porque ele quase não tem vida. Ele se arrasta pela vida e pela faixa. Ele não levanta o braço, não ergue os olhos do chão, faz só um arremedo, uma insinuação de que vai mover o braço e se você não fizer questão absoluta de parar, por ele... tudo bem. Ô dó!
Quem é que em um dia saiu de casa atrasado e não encontrou com a pedestre “velhinha reumática”? A sujeita não dá sinal de vida porque uma mão está segurando uma bengala e a outra agarrada na bolsa ou na sacola com sabe lá o que dentro. Ele apressa o passo para chegar logo na beira da calçada, mas assim que percebe que você parou o carro, a pressa acaba. Ela vai beeeeeem devagarzinho, degustando cada passada. Por vezes olha bem na cara do motorista, dá um sorriso amarelo, como se quisesse se desculpar, mas você sabe que por dentro ela está a-do-ran-do a aventura.

Poucos pedestres me divertem tanto quanto a gostosa do baile funk. Calça jeans de cintura baixa, saltão, cabelo na chapa - ela não dá sinal de vida, ela vive seu momento miss - a “bela” acena para os motoristas. Eu já vi taxista parando... hilário! Desfilando na faixa ela dá uma olhadinha pra sacar se o motorista é mesmo “o” motorista. Quando dão de cara comigo elas economizam no rebolado e levantam o queixo como se eu tivesse dito um desaforo. Fazer o quê se eu não tenho o que você gosta, filha?
E os ciclistas preguiçosos? Aqueles que não descem da bicicleta para atravessar, já repararam como todos têm uma cara de “sei que tô fazendo merda”?Os pedestres tímidos requerem uma atenção especial. Vejam bem, eles não querem que você pare. Ficam constrangidos de ter que atravessar a rua com alguém olhando. Alguns fazem de conta que estão esperando alguém ou alguma coisa. Reparem. Se você insistir e parar, eles vão virar para o outro lado, vão ficar de costas para a pista ou vão voltar a caminhar na direção em que estavam vindo.
Já viram os pedestres guardas de trânsito? Se eles estão no meio da faixa e o motorista não espera que eles completem a jornada, olham com cara feia e fazem uma espécie de mímica, fazem de conta que estão anotando o número da placa em um bloquinho invisível. Aí, aí, que meda!
Eu me divirto. Gosto de ver os pseudo-atletas de IPOD na orelha; as senhoras passeando com seus cachorrinhos; os jovens marrentos com seus pit-bulls; os trabalhadores desesperados, correndo para não perder o ônibus; as mulheres com sacolas, bolsa, guarda-chuva, arrastando filhos, lancheiras e mochilas (coitadinhas... parecem xerpas, aqueles guias do Nepal que carregam as coisas dos alpinistas que vão escalar o Everest). Gosto de ver os pedestres turistas fazendo cara de espanto quando os carros param...
Gosto de ficar por uns segundos imaginando se as pessoas que passam na frente do meu carro são felizes, se transaram na noite anterior, se viverão mais do que eu. Gosto de ver o povo da nossa Brasília, gente que não merece ser colocada no mesmo saco que os políticos - senadores e deputados de todos os cantos do Brasil, que vêm para cá cumprir os mandatos para os quais foram eleitos pelo povo dos seus estados. Né não?

terça-feira, 13 de novembro de 2007

Papai Noel já chegou?


Gente, como dizem meus amigos gays - “Eu tô bege!”
É... estou pasma! Não dá pra crer na ansiedade, para não dizer ganância, dos lojistas. No início de outubro os vitrinistas dos shoppings, sem nenhum pudor, já estavam pendurando bolinhas nas árvores e, no fim do mês, Papai Noel chegou e assumiu seu trono. O que é isso, meu Deus?

Vocês lembram da ONOGÁS? e do Papai Noel de agosto da ONOGÁS? Então... era engraçado, inusitado, Papai Noel chegar em agosto.
Eu sou daquelas que desde sempre se deprimem no Natal, confesso! Meu pai um dia me contou que quando eu tinha uns seis anos, depois de ouvir aquela música - “Como é que Papai Noel não se esquece de ninguém.... seja rico, seja pobre, o velhinho sempre vem...” - eu disse a ele: “Pai, isso é mentira, né? Tem criança pobre que não ganha nada, que eu sei!”.
O consumismo de fim de ano me adoece e não é de hoje. Quando entro em um shopping e escuto as musiquinhas de Natal tenho vontade de sair correndo. O espírito de Natal, em geral, só se apodera da minha pessoa na véspera do Natal. Creio que ele chega no cheiro do Tender... Mas, sou chata, não gosto de ceia farta. Quando vejo aquele monte de comida à mesa também não me sinto bem. Culpa – essa herança judaico-cristã... fazer o quê?
Este ano tive uma surpresa. O espírito do Natal me pegou bem mais cedo. Meu coração de repente se encheu de amor. É que Papai Noel chegou mais cedo, de verdade, para uma querida amiga. Minha amiga “D” está apaixonada, está vivendo uma linda história de amor. A “D” tem aquilo que os franceses chamam de “joie de vivre”, uma alegria de viver que é sempre contagiante. Imaginem agora, que ela está amando!
Pois é, foi só conversar com ela e bum! Fiquei com vontade de abraçar meu marido, meu filho, meus amigos! Fui tocada. Natal é isso! É celebração da vida, do amor! É ficar feliz junto, com o outro, pelo outro.
Gente, já ganhei meu presente - o sorrisão da "D" não tem mastercard que compre! Papai Noel já chegou!

FELIZ NATAL PRA TODOS! FELIZ NATAL! FELIZ NATAL!

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Cuspindo sapos
















Minha avó Alzira me contava muitas estórias. Já postei uma das minhas favoritas - a história da Festa no céu, lembram? Nunca me esqueço do dia em que ela me contou a estória de uma princezinha, linda, linda, linda! Todos os moços da cidade em que ela vivia se apaixonavam por ela. Até que ela abrisse a boca para falar. Quando ela falava, ao invés de palavras, saltavam de sua boca sapos e mais sapos. Se o rapaz não fosse esperto o sapo grudava no seu rosto.
Neste fim de semana contei esta estória a meu filho e fiquei pensando em como essa estória é verdadeira! Todo mundo, de vez em quando solta sapos pela boca, diz cobras e lagartos. Não é mesmo?
O que fazer para não agir impulsionado pela raiva?
Penso que para não andar por aí como a princesinha da estória que minha avó contava, cuspindo sapos, é importante prestar atenção aos momentos em que os estamos engolindo.
Em um texto chamado “A arte de engolir sapos”, o psicanalista Rubem Alves explica assim a expressão - "Ter de engolir sapo: ser forçado a colocar dentro do corpo aquilo que é nojento, repulsivo, viscoso, frio, mole”.
Ninguém engole sapo porque quer. Engole porque não tem outro jeito, porque foi obrigado, porque têm medo de confrontar a pessoa que o fez engolir o sapo. Então o sapo fica ali, entalado, e quando a pessoa menos espera – pula em cima de alguém que muitas vezes não tem nada a ver com o pato, ou melhor, com o sapo anteriormente engolido. Há, ainda, pessoas que não digerem os sapos engolidos e acabam adoecendo.
Certa vez recebi no consultório um rapaz que me disse: “Se eu não colocar minha raiva para fora vou ter um enfarte. A partir de hoje não vou mais engolir nenhum sapo!”. Etapa comum em alguns processos terapêuticos – sair do branco para o preto, ou do preto para o branco, sem passar pelo cinza...
Todo mundo engole sapo de vez enquanto. O importante é não eternizar no corpo a mágoa, o rancor, a humilhação.
No Grande Sertão, Guimarães Rosa escreveu um diálogo entre jagunços matadores da seguinte forma: Diz um: "Mato, mas nunca fico com raiva". O outro retruca espantado: "Mas como?" O primeiro jagunço explica: "Quem fica com raiva leva o outro para a cama".
Para não levar para cama a pessoa que nos obrigou a engolir o sapo é preciso falar sobre isso com alguém em quem confiamos, é necessário encontrar a nossa forma de lidar com essa coisa “nojenta, repulsiva, fria, mole” que por vezes deixamos ficar dentro de nós ou jogamos nos rostos dos outros.