segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Cuspindo sapos
















Minha avó Alzira me contava muitas estórias. Já postei uma das minhas favoritas - a história da Festa no céu, lembram? Nunca me esqueço do dia em que ela me contou a estória de uma princezinha, linda, linda, linda! Todos os moços da cidade em que ela vivia se apaixonavam por ela. Até que ela abrisse a boca para falar. Quando ela falava, ao invés de palavras, saltavam de sua boca sapos e mais sapos. Se o rapaz não fosse esperto o sapo grudava no seu rosto.
Neste fim de semana contei esta estória a meu filho e fiquei pensando em como essa estória é verdadeira! Todo mundo, de vez em quando solta sapos pela boca, diz cobras e lagartos. Não é mesmo?
O que fazer para não agir impulsionado pela raiva?
Penso que para não andar por aí como a princesinha da estória que minha avó contava, cuspindo sapos, é importante prestar atenção aos momentos em que os estamos engolindo.
Em um texto chamado “A arte de engolir sapos”, o psicanalista Rubem Alves explica assim a expressão - "Ter de engolir sapo: ser forçado a colocar dentro do corpo aquilo que é nojento, repulsivo, viscoso, frio, mole”.
Ninguém engole sapo porque quer. Engole porque não tem outro jeito, porque foi obrigado, porque têm medo de confrontar a pessoa que o fez engolir o sapo. Então o sapo fica ali, entalado, e quando a pessoa menos espera – pula em cima de alguém que muitas vezes não tem nada a ver com o pato, ou melhor, com o sapo anteriormente engolido. Há, ainda, pessoas que não digerem os sapos engolidos e acabam adoecendo.
Certa vez recebi no consultório um rapaz que me disse: “Se eu não colocar minha raiva para fora vou ter um enfarte. A partir de hoje não vou mais engolir nenhum sapo!”. Etapa comum em alguns processos terapêuticos – sair do branco para o preto, ou do preto para o branco, sem passar pelo cinza...
Todo mundo engole sapo de vez enquanto. O importante é não eternizar no corpo a mágoa, o rancor, a humilhação.
No Grande Sertão, Guimarães Rosa escreveu um diálogo entre jagunços matadores da seguinte forma: Diz um: "Mato, mas nunca fico com raiva". O outro retruca espantado: "Mas como?" O primeiro jagunço explica: "Quem fica com raiva leva o outro para a cama".
Para não levar para cama a pessoa que nos obrigou a engolir o sapo é preciso falar sobre isso com alguém em quem confiamos, é necessário encontrar a nossa forma de lidar com essa coisa “nojenta, repulsiva, fria, mole” que por vezes deixamos ficar dentro de nós ou jogamos nos rostos dos outros.

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